Por Dr. Marcio
Rogério Renzo
“M., sexo
masculino, 46 anos, homem, pai de família, bem-sucedido. Tinha uma vida social
aparentemente normal. Tinha amigos, conversava normalmente, manifestava planos
futuros. Nos últimos dias foi visto murmurando. Dias após, veio a cometer
suicídio com arma de fogo. Posteriormente, chegou ao conhecimento de todos que
o pai dessa pessoa havia cometido o mesmo ato, no mesmo local e data
anteriormente onde fora encontrado.”.
O caso
acima vem ilustrar uma triste estatística. Segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS), cerca de 700 mil pessoas morreram em decorrência de suicídio,
somente em 2019. Isto representa uma em cada 100 mortes. Morrem mais pessoas
por suicídio do que por AIDS, homicídios, malárias, câncer de mama ou guerras.
É a quarta
causa de morte no mundo, entre jovens de 15-29 anos, depois de acidentes de
trânsito, tuberculose e violência interpessoal. A taxa de suicídio vem caindo
cerca de 36% no mundo nos últimos 20 anos, porém nas Américas a taxa foi na
contramão e subiu cerca de 17%. Mundialmente, apenas 38 países têm alguma
estratégia nacional de prevenção de suicídios em suas agendas.
Trazendo
para o nosso país, no período entre 2011 e 2015 foram cerca de 176 mil óbitos,
sendo que desse total 65,9% foram mulheres e 34,1% homens. Isso representa que
24 pessoas atentam contra suas próprias vidas todos os dias. É importante
destacar que nesse período houve um aumento das tentativas na ordem de 209,5%
para mulheres e 194,7% para homens (segundo Boletim Epidemiológico do
Ministério da Saúde).
Mas o que vem a ser o suicídio?
O Suicídio
é um fenômeno complexo e multidimensional decorrente de diversos fatores. É unanimidade
que não há um único fator que desencadeie a tentativa ou ao suicídio
propriamente dito. Há, no entanto, fatores de risco que podemos observar e em
alguns intervir para que possamos diminuir os casos, como: tentativas
anteriores de suicídios, fatores genéticos, suporte social e familiar e
psicopatologias.
A
Depressão maior está, em diversos estudos, relacionada ao evento suicídio,
sendo citado que uma pessoa neste estado de depressão tem a probabilidade
aumentada em 10 vezes de planejar, tentar ou cometer o ato. Outro fator
importante, não está apenas ligado ao fato de diagnosticar precocemente a
depressão e sim, além de identificar, o paciente deverá ter um tratamento
adequado para este quadro depressivo. É o que realmente impedirá a pessoa de chegar
ao resultado tentativa ou suicídio.
Como prevenir este comportamento?
A OMS
pensando nos países que não possuem estratégias delimitadas para a prevenção de
suicídio lançou o manual, o LIVE LIFE – um guia de implementação
para prevenção de suicídios nos países, que mostra quatro estratégias para abordagem
do tema:
- Limitar
o acesso aos métodos de suicídio, como pesticidas e armas de fogo;
- Educar a
mídia sobre a cobertura responsável do suicídio;
- Promover
habilidades socioemocionais para a vida dos adolescentes;
-
Identificação precoce, avaliação, gestão e acompanhamento de qualquer pessoa
afetada por pensamentos e comportamentos suicidas.
Estes objetivos foram estabelecidos pois
estudos identificaram que os envenenamentos por pesticidas contribuem em cerca
de 20% nos casos de suicídios, aliados à utilização de armas de fogo que devem
ser mais restritos os seus acessos. A educação da mídia ajuda em coibir o que
chamamos de suicídio por imitação, pois ao divulgar de forma inadequada,
principalmente quando envolve celebridades, estimula-se esta ação, além de
divulgar formas de suicídio.
A
adolescência é uma fase da vida onde há o desenvolvimento de habilidades
socioemocionais, pois é nesta fase onde os problemas de saúde mental costumam
surgir. Problemas como bullying, o acesso precoce ao álcool e entorpecentes
favorece o desenvolvimento de doenças mentais, violência doméstica e pressões
psicológicas.
A
capacitação dos profissionais de saúde para identificação precoce, avaliação,
acompanhamento e gestão de programas devem estar no centro das discussões das
agendas dos governos para que a política de prevenção ao suicídio atinja o
sucesso esperado e orientações quanto aos programas de apoio devem ser
divulgados intensamente.
Como identificar alguém que precisa de
ajuda?
Pessoas
com ideias suicidas costumam dar sinais e fazem comentários sobre esta
possibilidade. Fique atento aos sentimentos dessas pessoas, os chamados 4
“D”: depressão, desesperança, desamparo e desespero. Frases como: “Eu
preferia estar morto”, “Eu não posso fazer nada”, “Eu não aguento mais”, “Eu
sou um perdedor e um peso pros outros”, “Os outros vão ser mais felizes sem
mim” são expressões que devem acender o “sinal de alerta” para os
familiares e amigos e um indicativo de que esta pessoa necessita de
atendimento especializado.
A vida tem-se
tornado a cada dia mais atribulada e comportamentos de nossos entes queridos,
por vezes, nos passam despercebidos, porém é muito importante estar atento aos
comportamentos abaixo:
1.
comportamento retraído, inabilidade para se relacionar com a família e amigos,
pouca rede social;
2. doença
psiquiátrica;
3. alcoolismo;
4. ansiedade ou
pânico;
5. mudança na
personalidade, irritabilidade, pessimismo, depressão ou apatia;
6. mudança no
hábito alimentar e de sono;
7. tentativa de
suicídio anterior;
8. odiar-se,
sentimento de culpa, de se sentir sem valor ou com vergonha;
9. uma perda
recente importante – morte, divórcio, separação, etc.;
10. história
familiar de suicídio;
11. desejo
súbito de concluir os afazeres pessoais, organizar documentos, escrever um
testamento, etc.;
12. sentimentos
de solidão, impotência, desesperança;
13. cartas de
despedida;
14. doença
física crônica, limitante ou dolorosa;
15. menção repetida
de morte ou suicídio.
Encontrei uma pessoa nessas
condições. E agora?
Esse é um
momento crucial para o desenrolar de todos os momentos que virão com esta
pessoa, que está muito fragilizada. Portanto, procurar um local adequado, onde
vocês possam ter uma certa privacidade é essencial para iniciar esta conversa.
Você deve ter e poder dedicar atenção exclusiva a ele e acima de tudo, ouvi-la.
Essa disposição para ouvir é o passo mais importante para reduzir a intenção
suicida dessa pessoa.
Uma
abordagem tranquila, respeitosa e acima de tudo, desprovida de julgamentos é
essencial para que a comunicação entre vocês seja bem-sucedida.
Ouvir a
pessoa, demonstrar empatia, dar acenos de aceitação e respeito, demonstrar
autenticidade, mostrar preocupação e afeição e sempre focar nos sentimentos da
pessoa são sinais que fortalecerão este elo entre vocês.
Por outro
lado, demonstrações como: ficar chocado ou muito emocionado, interrompê-lo com
frequência, dizer que está ocupado, fazer com que o problema dele pareça menor,
mostrar superioridade, fazer perguntas indiscretas, dizer que tudo vai ficar
bem e emitir julgamentos ou tentar impor seu parecer são comportamentos que
serão absorvidos pela pessoa com ideias suicidas como nocivas. Portanto,
muito cuidado!!!
Onde procurar ajuda?
No Brasil,
a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) que foi instituída em 2011, pelo
Ministério da Saúde, criou uma gestão integrada e descentralizada dos meios de
atendimento que passa pelas Unidades Básicas de Saúde (UBS), os Centro
de Apoio Psicossocial (CAPS), passando por leitos de hospitais gerais e
o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU – Telefone 192) e
outros serviços de urgência e emergência, com a finalidade de diagnosticar as
necessidades de saúde em cada uma de suas áreas, de forma a organizar os
cuidados em saúde mental e efetivar a atenção psicossocial às pessoas com
ideação suicida e a seus familiares, por meio da elaboração de ações
terapêuticas e monitoramento de cada caso.
Outra
forma de buscar ajuda é através do Centro de Valorização da Vida (CVV),
uma organização não-governamental que atual em todo o país pelo telefone 188
(24 horas por dia, todos os dias) e também por meio de atendimentos
presenciais, nas principais cidades de todos os Estados da federação.
Em caso de
emergência, caso você se depare com alguém atentando contra a própria vida, ligue
192 para o SAMU ou 193 para o Corpo de Bombeiros.
Sua
atenção e ajuda pode salvar uma vida.
Imagem/divulgação